Hoje, partilho o mesmo tema com dois amigos que me são particularmente queridos, a Lívia Azzi, do blogue INQUIETUDE DO PENSAMENTO, e o Hamilton Kubo, do PROFUNDO PENSAR. Uma blogagem colectiva nascida dum encontro no espaço virtual, duma ideia espontânea discutida a três, duma vontade de passar para o outro lado do espelho, dando as mãos duma forma real, e despertando os sentidos de todos os que, com um click, acederem a este trio de Impérios. Aviso à navegação - não tenho bolinha vermelha, nem vou pedir o Bilhete de Identidade á entrada, mas este post é PARA ADULTOS.
O Império dos Sentidos, é o título dum filme polémico realizado em 1976 por Nagisa Oshima e baseado num acontecimento real, que teve lugar no Japão do final dos anos 30 - a história da paixão tórrida e obsessiva entre Sada Abe, uma geisha, e o dono do restaurante em que trabalhava. Uma manhã, Sada, é encontrada a vaguear numa rua de Tóquio, com o pénis do seu amante embrulhado num furoshiki (lenço, pano). No filme, Oshima dá corpo duma forma fascinante, a uma escalada erótica em que todas as fronteiras vão desaparecendo, os amantes cada vez mais isolados dentro do seu próprio prazer, até a tragédia se apresentar como um desenlace inevitável e desejado. Levando bastante mais longe o choque causado quatro anos antes pelo Último Tango Em Paris de Bertolucci, Oshima incluiu no filme, cenas de sexo não simulado, o que teve como consequência proibições de exibição em diversos países. No Japão, o filme nunca foi apresentado sem que os genitais dos actores estivessem obscurecidos ou pixelados. Se as shunga - (versões eróticas das xilogravuras Japonesas produzidas entre os séculos XVII e XX), literalmente "gravuras da Primavera", sendo a Primavera um eufemismo Japonês para sexo - expunham sem restrições os genitalia, mantendo os personagens retratados muitas vezes vestidos, a partir do final da Era Meiji(1868-1912) foram proibidos não os nús, mas a exibição de orgãos sexuais e pelos púbicos.
Japanese Shunga, Hokusai, 1815 -Via Wikipedia
Curiosidades duma sociedade em que no aglomerado blade-runner de Kabukicho, Shinjuku, Tóquio, uma imensa sinalética de néons, cartazes, fotos, anuncia todas as fantasias, das massagens eróticas a bares de lingerie, dos hostess masculinos aos femininos, dos hand jobs, aos blow jobs...tudo é perfeitamente legal desde que não haja honban, relação sexual propriamente dita...
FOTO: BANZAI, Kabukicho
"O que é honban?" Perguntei eu.
Shimozawa pareceu surpreendido.
"Não sabes o que é honban?"
"Não."
"É o verdadeiro acto sexual. Inserção do pénis na vagina." respondeu ele sucintamente.
"Não é isso que se faz em todos os clubes de sexo?"
"Não precisamente."
"Bem, se os clientes dos clubes de sexo, não inserem os pénis em vaginas, o que é que andam a fazer com eles?"
in Tokyo Vice, Jake Adelstein
FOTO: BANZAI, Kabukicho
Os Japoneses são por natureza perfeccionistas, e o sexo não é excepção. O The Manual of Superorgasmic Fellatio and Cunnilingus - with over 400 Photos, ocupou durante algum tempo, o quinto lugar nas vendas da Amazon Japan. Nunca tive o livro na mão, mas suponho que deva ser bastante elucidativo, se os locais essenciais não estiverem cobertos de quadriculados...
Mas são exactamente estes blur, estas sombras, este mistério, este refinamento, que alimentam o meu fascínio pelo erotismo nipónico.
É a ausência de uma luz crua e total de que fala Junichiro Tanizaki no seu "In Praise of Shadows" - "(...) os nossos antepassados criaram um mundo de sombras e no fundo, nas profundezas deste, a mulher como o mais branco dos seres." A face branca da geisha, a sugestão dum sumptuoso kimono apenas entreaberto, o kimbaku das fotos de Nobuyoshi Araki...
"Kimbaku é diferente da bondage Ocidental. Eu só amarro o corpo duma mulher, porque não consigo amarrar o seu coração. Amarrá-la torna-se um abraço." Nobuyoshi Araki
FOTO: NOBUYOSHI ARAKI
Diz-se que as folhas da andrómeda Japonesa, ashibi ou asebi, são tóxicas, de tal forma que, se um cavalo por acaso as mastiga, perde o equilibrio e vacila como se estivesse embriagado. Nos arredores do Templo de Kasuga, em Nara, há uma floresta em que abundam ashibi com centenas de anos. Os veados que por ali circulam livremente, parecem conhecer a natureza tóxica da planta e nunca a tocam. Perdermo-nos num aroma inebriante, sabendo que este pode ser como veneno - esse é o retrato do amor sensual entre um homem e uma mulher. Uma vertigem, um salto no escuro, o salto kierkegaardiano.
E com "eyes wide shut"...deslizamos em lençóis de cetim, rendidos ao império dos sentidos.
FOTO: NOBUYOSHI ARAKI
28 comentários:
"Eu só amarro o corpo duma mulher, porque não consigo amarrar o seu coração" [intenso!!]
Linda analogia. Planejar e escrever sobre essa temática com vocês foi um grande prazer. Posso dizer que também me senti amarrada, não por cordas, mas pelo intenso vínculo de carinho que nos une.
Os sentidos podem nos levar tanto às nuvens quanto ao mais tenebroso abismo, não é? Achei o roteiro desse filme genial e o fato de ser baseado em história real reforça o sentido da reflexão e contextualiza toda a abordagem.
Beijos!!
Lolipop queridona!
Mais um post bacana, trazendo aos mais jovens que não conhecem sobre tais filmes de sucesso dos anos 70, toda a controvérsia e furor que provocaram.
Eu vi O Último Tango em Paris e O Império dos Sentidos, na época com uma amiga mais velha e moderna, meu pai nem poderia imaginar que íamos ao cinema para ver filmes tão, digamos, quentes, mas ele não sabia e nem poderia entender a simbologia que tinha por trás dos atos sexuais e do cinema novo que se descortinava.
Achei interessante que os japoneses não expunham o sexo abertamente como é aqui no Brasil, nem podia imaginar isso, mas tem a ver com a maneira simbólica que eles compreendem estas coisas.
A flor japonesa Ashibi que nos apresenta é linda, lembra mesmo o órgão genital feminino e a simbologia é própria para o caso da paixão que arrasta e envenena.
Posts assim, fazem-nos pensar, já de forma adulta de um outro ângulo sobre estes temas, diferentemente de quando éramos jovens.
Parabéns pelo lindo e delicado post!
beijos mil
Olá, Margarida!
Mais chocante e perturbador do que o próprio filme, é a história real que lhe serve de suporte: A procura do prazer levada a um extremo inimaginável, paradoxal, para o cidadão comum, conseguido através daquilo que é o seu oposto: o do sofrimento extremo. A ideia é perturbadora, "to say the least"!
Quanto aos limites daquilo que a sociedade entende como aceitável para ser exibido em público,a bitola de referência varia dum extremo ao outro, e não nos parece que apenas em função de conceitos ou princípios morais. O lado comercial da questão é nalguns países quem, aparentemente, fala mais alto - e cada vez mais influencia esses mesmos limites.
Já agora, e para terminar,sempre lhe digo que foi corajosa ao trazer aqui este tema;tenha cuidado, não vá a polícia dos bons costumes bater-lhe à porta...
Um abraço.
Vitor
Olá minha querida, vocês conseguiram uma linda sintonia nessa blogagem conjunta. A Lívia disse que foi um prazer escrever e digo que foi um prazer poder ler. Bjosss
Margarida
Não assisti esse filme, mas consegue-se, pela tua resenha e comentários, entender a diferença na maneira de encarar o sexo no oriente.
Interessante o comentário do Ale. Ainda não li nada sobre isso no blog dele.
Os posts estão de tirar o fôlego e aquecer o corpo e o coração.
Bela sintonia. Adorei.
Bjs no coração!
Nilce
Lolipop querida!
Que maravilha de post!
Que capricho!
Ainda não visitei seus amigos...o farei em seguida.
Eu aprendi demais por aqui hoje.
Muito muito interessante.
A flor me lembra as orquídeas...não sabia que era tóxica.
E finalizou com excelência!!!
"Perdermo-nos num aroma inebriante, sabendo que este pode ser como veneno - esse é o retrato do amor sensual entre um homem e uma mulher. Uma vertigem, um salto no escuro, o salto kierkegaardiano. E com "eyes wide shut"...deslizamos em lençóis de cetim, rendidos ao império dos sentidos."
Parabéns minha amiga...parabéns.
Agora vou visitar seus amigos.
Beijo grande.
Astrid Annabelle
O sexo é um ato tão sagrado que muitos dizem que até o Espírito Santo se ausenta ante o ato conjugal dos esposos. Se é verdade não sei rs...
Bonito o modo como você expôs o assunto.
Beijos a alma, querida!
Sweet Loli!
Gostei muito da forma como, os meus três amigos, abordaram o tema.
Perfeito! Nada chocante! Achei mesmo muito belo este post!
A amiga Lívia diz tudo nesta frase... "Os sentidos podem nos levar tanto às nuvens quanto ao mais tenebroso abismo".
No filme em questão, assim aconteceu.
Parabéns e beijos aos três.
Huge Hug
Ná
PS.
Like you, I feel a bit under the weather.
Take care.
Queridos amigos,
A foto do Araki, é de facto duma orquídea e nada tem a ver com a ashibi...fui eu que os induzi em erro, desculpem.
Quanto ao post...espero que não o achem "eventualmente chocante"...
Beijos
LOLI
Cada um com sua cultura e princípios.
Os Japoneses buscam a total excelência é o que vemos aqui em empresa japonesas.
São perfeccionistas em tudo e transformaram o Japão num paraíso.
Beijos e boa semana
Olá lolipop.
Arrojada aposta num tema controverso mas, abordado de uma forma primorosa!
Conheço o filme, embora, deva dizer que não o vi até ao fim...
Bela postagem a trois...non menage!
Beijos
Janita
Amiga Margarida!
Obrigado pela visita!
Não vi o filme, não posso avaliar.
Quanto ao post! Quente! Mas muito decente!
Uma abordagem de mestres.
Gostei.
Pedro
Olá minha querida, como vai?
Apesar de não ter oportunidade de ter assistido a esses filmes, pude absorver de uma forma interessante os temas em questão, me deixou ainda mais intrigada!
É uma honra me aprofundar através de suas palavras!
Beijo grande
Saudações minha queridissima amiga Lolipop... Peço desculpas pela demora, mas como lhe disse estive sem computador após a postagem, e ainda não ficou bom, portanto vou formatá-lo novamente, mas antes vim aqui contemplar este lindo trabalho em equipe... A qual devo dizer "Amei" fazer junto a vocês, meu "MUITO OBRIGADO" a você e a querida Lívia.
Vamos lá... Permita-me...
"Eu só amarro o corpo duma mulher, porque não consigo amarrar o seu coração. Amarrá-la torna-se um abraço." Nobuyoshi Araki
Simplesmente divina tais palavras, uma definição para lá de perfeita.
Quanto ao Filme "O Impérido dos Sentidos" confesso que apenas fui me dar conta quando a Lívia me disse, já me falaram sobre ele tempos atrás, mas ainda não o assisti, vi algumas cenas no Youtube.
Aparentemente me parece ser ardente, no entanto trágico.
Quem sabe um dia!! (risos)
Quero parabeniza-la pela perfeição de sua postagem, ainda mais considerando que não estava em 100% de sua saúde, o que hoje espero que esteja de fato.
Ficaram perfeitas as colocações e apensa para variar aprendi novamente um bocado aqui...
"honban" não conhecia até ler sobre ele aqui...
Igualmente sobre a linda flor andrômeda japonesa, que inclusive gostaria de ter aqui em casa. Para enfatizar o sexo tal como ela enfatiza.
Agora sobre as vestimentas, confesso como homem que uma mulher vestindo roupas mínimas chama sim a atenção... mas não desperta o "interesse" propriamente dito.
O que se difere completamente se a mulher estiver com roupas em que se esconda, deixando se mostrar aos mínimos... Essa sim desperta um interesse mais intenso, mais elevado...
Bom, minha linda é isso.
Mais uma vez, meu muito obrigado pela companhia brilhante que se fez a postagem...
E que a vida seja sempre assim, um Império de Sentidos... "Sejam eles quais forem"
Beijos, beijos...
Adoro você!
Pode ser tudo mais leve...
Beijo Lisette.
貴方のエロチックに関する研究は素晴らしいです。
それらは、芸術です。
Boa noite Margarida,
parabéns pela forma elegante e brilhante com que abordou este tema.
Gostei muito!
Beijinhos,
Ana Martins
Ave Sem Asas
Muito bom o post Margarida!
O Japão, apesar de muito conservador, aprecia muito o erotismo. Eu não sabia disso até ir para lá. Me assutei com a quantidade de publicações e filmes disponíveis. Em Tokyo conheci prédios com vários andares dedicados a isso. Os fetiches como o kinbaku/shibari e o bukkake são bem populares lá mas o erotismo é um pouco diferente do que no Ocidente. Digamos que tem um ar diferente...poético como a frase que você citou..."Eu só amarro o corpo duma mulher, porque não consigo amarrar o seu coração"...
Bjo e boa semana,
Carlos
Olá Loli.
Honrando o repto que me deixou no TLNBJ, eis-me então!
Excelente tema, e sugiro-lhe que torne a pegar-lhe num futuro próximo e que elabore mais.
Confesso — isto até parece mentira … — que nunca vi, de uma ponta à outra,"O Império…" de Oshima — não que não tenha interesse, que o tema não me cative, simplesmente nunca calhou! conheço a obra, naturalmente, do muito que se fala, já se falou, escreveu e escreve acerca da mesma, mas a verdade é que nunca dediquei um par de horas ao respectivo visionamento, admito…
Ainda assim, e no que concerne à história de Abe Sada, a respeito desta posso gabar-me de estar relativamente bem documentado acerca da mesma.
E a esse propósito tenho tão-só um pequenino reparo a fazer-lhe, minha Querida:
por favor, não lhe chame geisha… — A 'menina' Abe, personagem fascinante, que não restem dúvidas a esse respeito, de facto, algures pela década de vinte adentro terá tentado a sua sorte no exigente círculo das 'O'chaya' de Kansai (Osaka, Kyoto), mas sem qualquer brio que lhe proporcionasse admissão em tão severo métier — como 'maiko' era, de facto, péssima (os testemunhos são unânimes a esse respeito), e cedo enveredou por uma carreira mais fácil e rentável no bairro de Tobita, em Osaka...
Mas é certo que por volta de 1935 optou por deixar a profissão que exercia em Osaka, sonhando abrir o seu próprio negócio algures longe dali, tendo primeiro tentado a sua sorte em Nagoya e posteriormente tornado à sua Tokyo natal, onde viria então a conhecer o Sr. Ishida, em cujo restaurante foi aceite como aprendiz, e sendo certo que o estabelecimento em causa acolhia várias geisha de serviço, Sada Abe não era certamente uma delas...
Espero que possamos tornar a conversar sobre este interessantíssimo tema num futuro próximo.
Um Beijinho de Kyushu, ☺
Luís Afonso, NBj
A celebração iniciática expressa nesta filme, marcou-me porque a sua estreia foi pouco depois do 25 de Abril: estávamos também a celebrar a liberdade!
Beijo,
António
Gente eu fiquei muito encantado em saber tantas informações sobre a sexualidade oriental que querida margarida diferente em muitos pontos da nossa sexualidade ocidental e principalmente brasileira, aqui em que tudo sempre esta a vista, que tudo é vendido até a imagem do nosso país de grande puteiro, de terra livre da prostituição e do sexo fácil. desejei vê o filme
Excelente post!
Da trilogia (que passou na televisão pública em Portugal, sem censura, já à uns anos) em que se integrava "O Império dos Sentidos" do Nagisa Oshima assisti "O Império da Paixão", igualmente intenso. Adoro o cinema do Nagisa Oshima.
A visão japonesa da vida é completamente diversa da das outras culturas, excepção não poderia ser feita com o sexo.
A simbologia é o ritual da vida.
Abraços
Sensacional seu post picante, e vai melhorar mais ainda qdo Ale fizer o dele rsrs amei!
Filme polêmico dos anos 80, na época todo mundo tinha que assistir pelo extremo das cenas.
Não poderia ser diferente a proibição no Japão..
Loli, espero que o comentário que vc recebeu em japonês tenha sido positivo! rs
bjsss
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